quinta-feira, novembro 11, 2010

CARTA AO MINISTRO DA EDUCAÇÃO

“Nenhum de nós, nem os mais vividos, têm conhecimento de que os livros de Lobato nos tenham tornado pessoas desagregadas, intolerantes ou racistas. Pelo contrário: com ele aprendemos a amar imensamente este país e a alimentar esperança em seu futuro. Ela inaugura, nos albores do século passado, nossa confiança nos destinos do Brasil e é um dos pilares das nossas melhores conquistas culturais e sociais.”

Eis a resposta dos principais autores de livros infantis deste país. Foi publicada no dia 4 de novembro. A Academia Brasileira de Letras (ABL) já tinha reagido e divulgado o seu mais categórico repúdio à decisão de vetar As Caçadas de Pedrinho, livro de José Bento Renato Monteiro Lobato.

Depois foi a vez de Ana Maria Machado, Bartolomeu Campos de Queirós, Lygia Bojunga, Pedro Bandeira, Ruth Rocha e Ziraldo, que começaram um abaixo-assinado (trecho acima) contra a decisão do Conselho Nacional de Educação de tirar o livro de circulação. Há algumas semanas, leitores, estudantes, professores, artistas e intelectuais discutem o caso e tentam enxergar o conteúdo racista e ofensivo que o Conselho afirma existir na obra.

Um deles até enviou uma carta ao próprio ministro da educação. Num texto vibrante e inspirado, ele argumenta em defesa do criador do Sítio do Picapau Amarelo:

“Na época do seu José Bento, senhor ministro (com quem convivi na intimidade e de quem posso escrever e falar com pleno conhecimento de causa), inexistiam esses excessos do politicamente correto que, convenhamos, produzem situações deveras cômicas hoje em dia.”

Sujeito de autoridade, ele também aborda as diversas causas abraçadas por Lobato, relembrando, ainda, o seu espírito empreendedor e humanista. Lobato defendeu a exploração do petróleo brasileiro pelos brasileiros e combateu o descaso dos governantes em relação ao homem do campo. Agudo, seu defensor emprega um raciocínio multidisciplinar para lançar luz nas verdadeiras origens do preconceito no Brasil e no mundo. Repare na transcrição abaixo em que ele chega ao clímax da sua dissertação, opondo com maestria os pensamentos daqueles que acreditam no Livro da Gênesis e dos que apóiam a Teoria da Evolução das Espécies.

“Foram os Criacionistas que inventaram o racismo e a escravidão. Cavaram seus argumentos na Bíblia para fundamentar a existência de uma linhagem inferior sobre a face da Terra, os filhos de Cam, netos de Noé (que um belo dia, tendo Deus como avalista, jogou a famigerada maldição sobre toda a Canaã e originou as tais raças inferiores que, naturalmente, não mereciam o reconhecimento da humanidade). Ora, o seu José Bento sempre foi um libertário. Ninguém o conheceu melhor do que eu! Toda a sua obra, infantil e adulta, é Evolucionista e, portanto, antirracista.”

Visconde de Sabugosa, renomado intelectual brasileiro, assim arremata o raciocínio:

“De acordo com Charles Darwin, todos os habitantes humanos do Sítio descendem do macaco.”


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Crônica publicada no jornal Folha do Norte (jornal impresso de Bandeirantes, Paraná, Ano III, Edição 165 de 23/11/2010), no site Lençóis Notícias e no blogue Avassaladoras Rio. Todos os direitos reservados. A ilustração acima é de Voltolino, artista plástico que ilustrou as primeiras edições dos livros infantis de Lobato. 
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